Juízas debatem a participação feminina na justiça brasileira
Na noite desta quinta-feira (7), o espaço gourmet da sede campo da AMAMSUL sediou uma noite diferente, proposta pela juíza Camila de Melo Mattioli Pereira, diretora da Mulher Magistrada: uma palestra sobre a ‘A mulher na magistratura: cenários e perspectivas’.
A palestrante foi a juíza Mariana Rezende Ferreira Yoshida, da comarca de Rio Brilhante, mestranda em Direito e Poder Judiciário na Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (ENFAM), onde desenvolve pesquisas individuais e coletivas sobre a participação feminina na magistratura.
Respeitados os protocolos de biossegurança, as magistradas participaram ativamente do evento de forma presencial e pelo aplicativo Zoom. A interatividade tornou a noite ainda mais estimulante e Mariana explicou que o objetivo das pesquisas é impulsionar a igualdade de gênero e a participação feminina no Poder Judiciário, sendo que o objetivo de uma delas é, de forma inédita, projetar como será a participação feminina em todos os Tribunais brasileiros em 2030. Trata-se de uma pesquisa coletiva fruto de uma importante parceria entre a Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) e a ENFAM.
Assim, em uma narrativa envolvente, a palestrante mostrou dados sobre as mulheres na magistratura brasileira, com cenários e perspectivas. Mas quando as mulheres ingressaram na magistratura brasileira? Em 1897, Maria Augusta Saraiva foi a primeira mulher a frequentar um curso de Direito no Largo do São Francisco. "E a precursora na magistratura foi Auri Moura Costa, no TJCE, em 1939. Na mais alta Corte do país, a primeira ministra foi Ellen Gracie, no ano de 2000, mais de 190 anos depois da fundação do Supremo Tribunal Federal. Depois, somente mais duas mulheres alcançaram o posto de ministras do STF: Carmén Lúcia, em 2006, e Rosa Weber, em 2011”, explicou.
Ela apontou ainda que em 2020, o TSE decidiu que partidos devem ter cota feminina na disputa de diretórios porque a ministra Rosa Weber entendeu que, embora as legendas tenham autonomia, há uma lacuna legislativa sobre cotas de gênero para os cargos, permitindo uma maior participação da mulher.
“Lembro uma decisão muito importante e inovadora da nossa colega Joseliza Alessandra Vanzela Turine que recentemente, atuando na justiça eleitoral, reconheceu a procedência de uma representação do Ministério Público e decretou a cassação do diploma de um vereador eleito e empossado em 01/01/2021 por usar verba de cota feminina”, declarou.
Interagindo com as participantes do evento on-line e presencial, Mariana citou o censo do Judiciário de 2014, realizado pelo CNJ, quando se detectou que no 1º grau a participação feminina era de 37,2%; no 2º grau, 21,5%; e nos tribunais superiores somente 18,4%. “Nos dias atuais, embora a participação tenha feminina na carreira aumentado, a presença da mulher na justiça sul-mato-grossense ainda é decepcionante”, completou.
Pela pesquisa, no TJMS a participação feminina é de apenas 24,3% e os dados mostram que antes de 1990 não havia mulheres no cargo de Desembargadora em Mato Grosso do Sul. De 1991 a 2000, 63% da magistratura de MS era masculina e 37% feminina. De 2001 a 2010, os juízes representavam 68% e as magistradas eram 32%. Depois de 2011, o número de juízes alcançou 78% e a representação feminina ficou em 22%. Ela citou ainda a coletânea de artigos científicos resultado do I Fórum de Igualdade de Gênero nas Instituições, realizado pela AMAMSUL em agosto de 2019 e publicada pela associação em 2020.
"O TJMS foi criado em 1979, mas apenas em 1990 a primeira mulher alcançou o cargo de desembargadora: Dagma Paulino dos Reis. Em 2003, a Desa Tânia Garcia de Freitas Borges ingressa do TJMS, seguida pela Desa Marilza Lúcia Fortes (2006), da Desa Maria Isabel de Matos Rocha (2012), pela Desa Dileta Terezinha de Souza Thomaz (2018) e finalmente pela Desa Elizabete Anache (2019). A nossa Diretora de Interior da AMAMSUL, Kelly Gaspar Duarte Neves, foi a primeira mulher a judicar na comarca de Mundo Novo", acrescentou.
Ressalte-se que, além de ser a primeira desembargadora do TJMS, Dagma Paulino dos Reis foi também a 1ª juíza de MS, em 1979, na comarca de Rio Brilhante. Desde que foi criado em 1979, o Tribunal de Justiça de MS teve 80 ocupantes do cargo de desembargador, dentre os quais somente seis são mulheres – o que representa 7,5%.
E mais: das seis desembargadoras, uma veio do Ministério Público pelo quinto constitucional e das cinco oriundas da magistratura, somente uma foi promovida por merecimento. Além disso, de acordo com o livro "Comarcas", publicado pelo TJMS em 2016, das 79 comarcas de MS, algumas nunca tiveram uma juíza atuando como, por exemplo, Rio Verde de MT, Itaporã, Sete Quedas e Dois Irmãos do Buriti, além das 20 comarcas atendidas pela Carreta da Justiça, desde agosto de 2018.
Um detalhe importante: as comarcas de Bela Vista, Eldorado, Itaquiraí, Maracaju, Mundo Novo, Naviraí e Pedro Gomes uma única vez foram conduzidas por juízas em suas histórias.
“Dos números obtidos pelas mais diversas pesquisas, é possível concluir que a magistratura brasileira ainda é um nicho tradicionalmente masculino e branco; as mulheres ingressaram muito tempo depois e ainda enfrentam dificuldades no concurso e movimentação na carreira, e quanto mais alto o grau da carreira, menor é a participação feminina e maior é a discriminação sexista. O fato de haver sete mulheres e sete homens no 32º concurso para magistratura deve ser comemorado”, concluiu Mariana Yoshida.