Código de Trânsito completa 20 anos de vigência
O Código de Trânsito brasileiro completou essa semana 20 anos de vigência. Um avanço considerado importante em termos de rigor na punição de infrações, contudo, ainda existe um desrespeito muito grande à lei em todo o país.
Beber e dirigir passaram a ser crime com o Código de Trânsito, entretanto, a prática é comum nos municípios brasileiros. Em 2008, a Lei Seca aumentou a punição e diminuiu a tolerância. Celular, dirigir acima da velocidade, estacionar em local proibido, tudo passou a ser punido com mais rigor. Os exames médicos, que antes do código eram exigidos apenas para tirar a carteira de habilitação, passaram a ser renovados a cada cinco anos.
Apesar dos esforços para tornar a lei mais dura, infelizmente o número de mortes no trânsito no Brasil não diminuiu, ao contrário. De acordo com o divulgado na imprensa, foram mais de 35 mil mortes em 2007, antes do código, e o balanço mais recente mostra mais de 37 mil mortes.
Com números tão alarmantes será que é possível perceber um aumento no número de processos que envolvem acidentes de trânsito com mortes? Para o juiz Evandro Endo, da comarca de Itaporã, infelizmente sim. “Hoje o que predomina nas prisões em flagrante é a violência doméstica e a embriaguez ao volante”, aponta.
O juiz Wilson Leite Corrêa, da 4ª Vara Criminal de Campo Grande, não vislumbra tal aumento, mas ressalta que não são todas as mortes no trânsito que resultam em processos criminais. “Para que exista um processo criminal é necessário provar que o condutor tenha causado o acidente por dolo ou culpa”, esclarece.
Não há como negar que o trânsito, principalmente nos grandes centros, está cada vez mais difícil. É perceptível que no país houve um aumento da frota de veículos. Seria esse um dos motivos que impediriam a redução do número de acidentes?
“Não acredito que apenas o aumento da frota veicular seja o motivo para o aumento das mortes no trânsito, mas sim a falta de conscientização e a cultura de que as fiscalizações de trânsito são inócuas e raras. A ideia de que só se deve respeitar as normas de trânsito quando existe uma blitz policial à vista ou notificada por uma rede social é lamentável e reprovável”, opinou Evandro.
Para Wilson, o fato de não haver redução do número de acidentes e mortes parece estar mais ligado à ausência de cuidados dos condutores. “Mas em certos casos também tem relação com a deficiência na fiscalização”, completa.
Acostumados a julgar processos que envolvem questões de trânsito, será que os juízes acreditam que seria melhor aumentar a fiscalização ou educar os motoristas? O juiz de Itaporã defende que a educação e a conscientização são o primeiro passo. “Em seguida é importante contar com o avanço tecnológico para se fiscalizar de maneira inteligente, econômica e, com isso, eficaz”.
O titular da 4ª Vara criminal lembra que os recentes acidentes em Campo Grande, com maior repercussão na mídia, ocorreram durante a madrugada. “Basta fazer uma retrospectiva deles para se chegar a essa conclusão. Nesse horário a fiscalização de trânsito é muito pequena, praticamente inexistente. Acredito que uma mudança nessa realidade poderia diminuir a quantidade de acidentes graves que ocorrem nesse horário”.
Questionado se a Lei nº 12.971/14, chamada de Lei do Racha, teve algum efeito prático que auxiliasse na redução do número de acidentes, Evandro Endo respondeu que as inovações legislativas, muitas vezes, seguem clamores populares de ocasião e, por isso, nem sempre se tornam efetivas.
“Quanto à previsão sobre corridas proibidas, não raras às vezes, se resultar em morte, gera o indiciamento pelo homicídio qualificado previsto no Código Penal, afastando-se a incidência até mesmo do Código de Trânsito, ou seja, gera a possibilidade de uma punição maior e baseada no Código Penal de 1940”.
Será que os juízes entendem que existe alguma mudança que pode tornar o trânsito melhor?
“Como dito, a mudança de cultura dos motoristas e o implemento de novas tecnologias na fiscalização como câmeras, lombadas eletrônicas, drones, bafômetros novos e em maior número”, concluiu Evandro.
“A legislação tem tornado crime e agravado a pena de várias condutas referente aos ditos crimes de perigo abstrato. Por tais crimes busca-se punir o condutor por infrações de trânsito antes que ocorram resultado como acidentes, lesões ou mortes no trânsito. Entendo que isso não está surtindo efeitos e gera incongruências. A pena para quem se envolve em acidente de trânsito e lesiona alguém e menos grave se comparada com a pena para quem dirige sob efeito de álcool, mesmo que este não seja causador de qualquer acidente. Acho que um dos caminhos é punir de forma mais severa quem causa acidentes, principalmente aqueles que causem lesões e mortes no trânsito”, finalizou Wilson.