A IMPORTÂNCIA DAS ASSOCIAÇÕES
Mostrar a história da Associação dos Magistrados de Mato Grosso do Sul (AMAMSUL) sem mencionar a gestão no
25º ano de existência da entidade é não mostrar seu crescimento e evolução. Na série de entrevistas que retratam a história, o JORNAL AMAMSUL traz a análise do Des. Marco André Nogueira Hanson, presidente da AMAMSUL na gestão 2003/2004,quando a associação atingiu o jubileu de prata. Com a palavra, o desembargador Hanson.
O sr. ingressou na magistratura de MS em 1986 e, alguns anos depois, assumiu a cadeira mais importante da AMAMSUL, quando foi presidente da entidade. Como era a AMAMSUL quando o sr. ingressou e quais os progressos conquistados quando o sr. assumiu a presidência?
HANSON: Quando se passa a lembrar de datas é sinal que o tempo fluiu, embora permaneça com os mesmos ideais que me fizeram ingressar na magistratura, ou seja, a vocação e a possibilidade de ajudar aquelas pessoas privadas de seu direito. Em 1986, tornei-me juiz substituto, exercendo a função em diversas comarcas do interior. Rio Brilhante, Maracaju, Dourados, São Gabriel do Oeste, Naviraí, Coxim e Campo Grande são cidades que me trazem muitas lembranças e, por outro lado, o conforto do dever cumprido. É importante saber que o juiz pode voltar às comarcas pelas quais passou.
Posso dizer que a AMAMSUL daqueles tempos era pequena, com poucos magistrados, no entanto, todos se conheciam e havia maior procura quanto aos temas de interesse da classe, isto é, o próprio papel institucional do Poder Judiciário, hoje relegado a segundo plano, talvez porque a própria sobrevivência do Judiciário como poder autônomo e independente esteja em risco. Havia maior vocação, e a cultura humanística e a experiência de seus membros eram fatores ponderáveis para o exercício da função.
Ser magistrado é luta constante, pois a magistratura vive de fases. Apesar do progresso material da classe, o patrulhamento aos magistrados tem sido injusto, com críticas infundadas e a perda de muitos direitos e prerrogativas que até então existiam na judicatura.
O que marcou a gestão de nossa diretoria nos anos de 2003/2004 foi a reestruturação administrativa, o pagamento de pendências financeiras, a reforma e construção de sedes e sub-sedes e a inauguração de nossa sede em Três Lagoas, bem como a defesa intransigente dos magistrados em todas as searas e a luta em conjunto com a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) quando da Reforma da Previdência, em Brasília, cujos efeitos poderiam ter sido ainda mais danosos, não fosse o trabalho desenvolvido por todos naquela época.
Posso dizer com tranquilidade, que em nenhuma oportunidade deixamos de dar respostas às violações de nossas prerrogativas constitucionais ou de ofensas indevidas a magistrados.
Como era a realidade na justiça estadual na década de 80, isto é, como eram os juízes e como estava este mesmo cenário quando o sr. foi eleito presidente?
HANSON - Os magistrados da década de 1980, ao que posso testemunhar, viviam sob as lembranças do regime militar, esperançosos com as mudanças que a nova Carta Magna de 1988 pudesse trazer. Era o tempo do Plano Cruzado, da era Sarney; quanta confusão jurídica. Foram muitas as alterações legislativas: Código do Consumidor, Juizados, Direito Ambiental, dentre outras novidades que alteraram profundamente o olhar no mundo jurídico.
Outros enfoques e decisões não prescindiam de um juiz atento e focado no seu tempo, sem entretanto contar com o computador e a internet. Foram momentos de grande esforço e sacrifício. Mas é o novo que impulsiona e renova nosso espírito.
Na ocasião da nossa gestão, as preocupações se voltaram à eleição do presidente Lula e à reforma da previdência. Existia muita preocupação quanto ao novo Governo e à forma como trataria o Poder Judiciário. O resultado todos conhecemos. O país mudou, e a magistratura e seus membros também, pois inescapável é o fato de que o recrutamento de juízes reflete sempre a própria sociedade em um determinado momento histórico, com todos os dramas e imperfeições.Como a poesia de José de Almada Negreiros, naquele tempo foi “terrível isto de viver o que há de vir entre os que apenas usam o que ainda há”.
Como foi, por dois anos, estar à frente dos magistrados de todo o Estado?
HANSON - Com muita honra e satisfação exerci os dois anos de mandato na AMAMSUL, um tempo de lutas, mas de muitas realizações e trabalho. Houve uma perfeita sintonia com as outras associações, instituições e outras entidades da sociedade, que entenderam nossos propósitos de fortalecer a sociedade civil e sua representação.
Foram muitos eventos festivos (com fins filantrópicos), culturais e sociais. Destaco a comemoração dos 25 anos da AMAMSUL e a homenagem aos ex-presidentes. Quem viveu aquele período pode dar seu testemunho. De nada me arrependo, mas o fato é que nada neste mundo é estável, tudo muda e tudo passa, compreendo isso também e não vivo de nostalgia. O tempo é hoje, agora.
Quais as principais conquistas de sua gestão?
HANSON - Acho que já disse quais foram as principais realizações daquela gestão, lembrando que havia uma permanente preocupação com os magistrados, principalmente do interior, com seu conforto e segurança. Inúmeras foram as iniciativas no sentido de proteger institucionalmente o juiz, solicitando às autoridades mecanismos para sua efetiva segurança.
Como o sr. via a AMAMSUL em 1986, como via quando presidiu a entidade e nos dias atuais, qual sua impressão?
HANSON - Tenho a sensação de que atualmente é muito mais difícil administrar a AMAMSUL. Os problemas são outros, relativos aos subsídios, às garantias e prerrogativas legais dos magistrados, à própria atuação do CNJ. As questões que dominam as discussões são as mais diversas, os próprios magistrados são bem diferentes.
A tecnologia e a transformação do tecido social trouxeram diversos questionamentos no âmbito associativo. A própria evolução das leis e as alterações constitucionais carregam consigo a necessidade de uma nova ótica de gestão da entidade.
Constitui tarefa árdua administrar os interesses legítimos da magistratura, perante o desprestígio, o desrespeito e às críticas maldosas que nos são dispensadas. O magistrado está frustrado, desmotivado e acabrunhado, fruto de uma política equivocada e de uma campanha sórdida para desmoralizar a magistratura. O cidadão precisa entender que sem uma magistratura forte e independente não há esperança de liberdade.
O sr. acredita que ainda vale a pena fazer parte de uma associação de classe ou essas entidades tendem a acabar?
HANSON - A força da sociedade está justamente na capacidade de ela se auto-organizar.
Na democracia o papel político das entidades que representam a sociedade civil é crucial para conter os avanços do Estado totalitário. Como leciona Francis Fukuyama, na obra “Construção de Estados”, a “tarefa da política moderna tem sido domar o poder do Estado, dirigir suas atividades para fins considerados legítimos pelo povo a quem ele serve e regularizar o exercício do poder de acordo com a lei”. Aí se inserem as associações no mundo moderno, como garantidoras das liberdades individuais e da democracia.