Segurança institucional no Poder Judiciário
Recentemente, a presidenta da República, Dilma Rousseff, editou o Decreto n. 7.496, de 8 de junho de 2011,
que institui o Plano Estratégico de Fronteiras. Seu objetivo é fortalecer a prevenção, o controle, a fiscalização e a repressão dos delitos fronteiriços e dos delitos praticados na faixa de fronteira brasileira. Suas diretrizes consistem (I) na atuação integrada dos órgãos de segurança pública e das Forças Armadas e (II) na integração com os países vizinhos.
Essa atuação, mais incisiva na prevenção, na fiscalização e na repressão dos crimes ontologicamente mais graves, sinaliza para uma nova fase do Direito Penal e para uma forma de agir do Poder Judiciário, que, em integração com as ações de segurança pública e das Forças Armadas, deverá preparar-se para a nova Era do Direito Penal, nomeadamente no que diz respeito ao crime organizado.
Aliás, é possível asseverar, em termos de tendência contemporânea, que o processo penal brasileiro deve se adaptar à atuação estatal no combate ao crime organizado, da mesma forma que o processo civil moderno está voltado a prestigiar as tutelas coletivas, como forma de mitigar o crescente e invencível aumento de demandas individuais em todos os foros do país.
A propósito, já existe, em tramitação, projeto de lei que melhor define o conceito de crime organizado, em conformidade com a Convenção de Palermo, bem como o procedimento judicial a ser adotado em casos tais.
Ademais, encontra-se em trâmite, no Senado Federal, o Projeto de Lei da Câmara (PLC) n. 3/2010, que possibilita ao juiz decidir pela formação de colegiado para a prática de qualquer ato processual, especialmente a decretação de prisão ou de medidas assecuratórias, concessão de liberdade provisória ou revogação de prisão, sentença, progressão ou regressão de regime de cumprimento de pena, concessão de liberdade condicional, transferência de preso para estabelecimento prisional de segurança máxima e inclusão de preso em regime disciplinar diferenciado.
Esse mesmo projeto cuida da chamada “segurança orgânica”, e desse tema é que pretendo tecer algumas considerações.
Nota-se que a natureza dos crimes que são perpetrados hodiernamente não mais se assemelha àqueles de antanho. Hoje, o Poder Judiciário é responsável por julgamentos de delitos cometidos por poderosas organizações criminosas, e essa proporção tende a aumentar, sobretudo em áreas fronteiriças, como é o caso de Mato Grosso do Sul, máxime com a implementação do sobredito Plano Estratégico de Fronteiras.
Se isso é um fato, uma realidade, como está a segurança orgânica do Poder Judiciário brasileiro? A propósito, algo se afigura incontroverso: a proporção das atividades criminosas está em franco desenvolvimento, mas o juiz continua sendo aquele mesmo de sempre. Em outras palavras: o magistrado é aquele mesmo que sempre saiu diariamente de seu lar e dirigiu-se ao seu local de trabalho sem nenhuma segurança estatal, conduzindo seu veículo e contando apenas com a proteção Divina.
O mais interessante em tudo isso é que, no ordenamento jurídico, as vítimas e as testemunhas em processo criminal têm a seu dispor um programa de proteção, assegurado pela Lei Federal nº 9.807, de 13 de julho de 1999, mas o juiz não conta com nenhum programa semelhante.
Os magistrados, como protagonistas da atuação estatal no combate à criminalidade, porque integrantes do Poder Judiciário, devem (ou deveriam) ter o mínimo de proteção para o exercício de seu mister.
Não obstante esse quadro factual, a magistratura brasileira deve urgentemente preocupar-se com a criação de setores de segurança institucional nos tribunais estaduais e nos federais, com efetivas atividades de inteligência, como forma de resguardar a atuação do Poder Judiciário, notadamente no que diz respeito ao crime organizado. Emerge a reflexão acerca da importância de o Estado (em sentido lato) dispor de uma estrutura que possa assegurar ao magistrado, para que desenvolva seu mister com tranquilidade e serenidade, elementos indispensáveis a manter sua imparcialidade na atividade mais difícil de ser cometida ao homem: a de julgar.
No âmbito local, felizmente, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul enfrentou poucos episódios envolvendo ameaças a magistrados ou a prédios pertencentes ao Poder Judiciário. Porém, há necessidade de estarmos preparados para bem amparar o magistrado.
O primeiro passo já foi dado. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou a Resolução n. 104, de 6 de abril de 2010 (alterada parcialmente pela Resolução n. 124, de 17 de novembro de 2010), pela qual estabeleceu o prazo de um ano para que os Tribunais Regionais e os Tribunais de Justiça, no âmbito de suas competências, tomassem medidas para reforçar a segurança das varas com competência criminal.
Além disso, o mencionado Projeto de Lei da Câmara n. 3/2010 também prevê que os tribunais devam adotar medidas para reforçar a segurança dos prédios da Justiça, especialmente: (1) controle de acesso, com identificação; (2) instalação de câmeras de vigilância; (3) instalação de aparelho detector de metal; (4) segurança ostensiva.
É previsto, ainda, que a proteção de autoridades judiciárias e de seus familiares em situação de risco decorrente do exercício da função poderá ser efetuada pelos órgãos de segurança institucional do Poder Judiciário.
Neste compasso, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul conta, atualmente, com a Comissão Permanente de Segurança Institucional, instituída por força do Provimento n. 205, de 21 de julho de 2010 (alterado parcialmente pelo Provimento CSM n. 237, de 2 de agosto de 2011), que tem realizado estudos para regulamentação, estruturação e formação de logística voltada ao atendimento dos magistrados, a fim de proporcionar-lhes tranquilidade para exercer a judicatura e propiciar a entrega da prestação jurisdicional adequada aos escopos que possam satisfazer os alicerces da Teoria Geral do Estado Contemporâneo.
Contudo, o aperfeiçoamento das ferramentas voltadas à formação de uma segurança orgânica depende do engajamento de todos os membros da laboriosa magistratura sul-mato-grossense, os quais devem oferecer suas sugestões que, no somatório, haverão de assegurar o produto final que represente o pensamento e o ideário contemporâneo.
Carlos Alberto Garcete
juiz titular da 1ª Vara do Tribunal do Júri de Campo Grande
juiz auxiliar da Vice-Presidência do TJMS